terça-feira, 25 de outubro de 2011

Amigo...



Seis meses sem caminhar pelas calçadas da princesa. Sem degustar um bombom de morango na Pelotense. Muito menos ver o pôr-do-sol na praia do Laranjal. Pior do que viver sem a doçura e a beleza de Pelotas, é ficar longe das pessoas que por tanto tempo fizeram parte da minha vida. Os mates na Donja. Os passeios. As companhias em dia de teatro Guarani. O simples fato de tê-los por perto. Sem eles a soberana perde a coroa.

terça-feira, 8 de março de 2011

As histórias do biso - Um encontro


Simples, conversa com qualquer um e sobre qualquer assunto e encanta pela sabedoria. A bombacha e a alpargata são fundamentais na sua vestimenta diária e por isso é uma figura interessante.
Nos últimos meses, ele tem feito mais parte da minha vida. Problemas de saúde fizeram com que precisasse ficar aos cuidados da família.
Ele é pai da minha vó Neli, que é mãe da minha mãe. Apesar dos 70 anos que nos separam, eu e meu bisavô Arnaldo temos uma afinidade inexplicável e tenho verdadeira adoração por ele.
Na certidão de nascimento consta o ano de 1919, mas não se sabe se foi esse ano mesmo que ele veio ao mundo. No alto dos seus 92 anos, goza de uma lucidez incrível, uma memória fantástica, sem falar na saúde... mantêm a mesma altivez e não aceita ser tratado como velho, o corpo até parece um pouco cansado, mas a cabeça vive plenamente... sem precisar de apoio, surpreende todos descendo as escadas com as mãos no bolso.
Passar as tardes conversando com o biso se tornou um passatempo muito especial.
Compartilhar as histórias, suas lembranças e um pouco de como começou a nossa família é a minha ideia em um espaço para ele no blog. Depois de ouvir seus "causos" vou transmitindo para essas páginas virtuais.
O vô Arnaldo é filho de uruguaios, casou-se jovem, e quando a mulher adoeceu teve que tomar uma difícil decisão, dar os filhos. Uma vida sofrida, de muitos desafios, mas com certeza de muito amor.

Vou começar por um tempo muito antigo...

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O adeus aos guarda-chuvas Sagebin

Conversando com o amigo Marcus lembrei deste texto e resolvi postá-lo novamente no blog. Texto escrito em setembro de 2009.

O adeus aos guarda-chuvas Sagebin




A máquina registradora do século passado que tem estampado na parte de trás Mil Réis já está tapada, pronta para ser pela primeira vez apenas um objeto decorativo. A tesoura importada da Bélgica de igual idade, cujo dono garante que não afia há vinte anos e desliza pelos tecidos como poucas, também será aposentada, assim como o ferro de passar trazido da França tão antigo quanto os outros artefatos encontrados no local.
O senhor de 81 anos espalha o tecido pela última vez em cima da mesa, usando o molde que o acompanha nos seus mais de 50 anos de profissão, ferramenta feita de material rígido, com a metragem rabiscada de lápis e com as pontas almogadas do tempo. Mesmo encerrando as suas atividades, ele não poderia deixar de fazer o último guarda-chuva, pedido de uma cliente, que sorridente trouxe um pano combinando com o traje. Ele não podia recusar.
Foi um tímido anuncio no jornal que divulgou o fechamento das portas do último estabelecimento especializado no conserto de guarda-chuvas e sombrinhas de Pelotas.
Mário Sagebin Filho, é conhecido pela excelência no seu trabalho, herdou a paixão pela profissão do sogro e assumiu o negócio da família.
Em tempos de edificações grandiosas, com arquitetura em moldes europeus e ornamentos rebuscados, os barões do charque enchiam de igual exuberância o interior dos prédios com móveis importados, feitos com dedicação e a altura do poder aquisitivo e exigência dos fregueses. Nos trajes e acessórios a mesma preocupação. Foi quando por necessidade de manutenção e criação de produtos na cidade, fábricas e serviços especializados surgiram para atender o mercado. Uma oficina de restauração de chapéus trabalhava exclusivamente na atividade, cinco funcionários atendiam a demanda que era grande, há registros que o primeiro ferro a vapor do estado foi adquirido por este estabelecimento.
Osório de Oliveira Tavares começou junto com o pai no ramo dos guarda-chuvas, muito utilizados pela elite pelotense, eram peças indispensáveis para a saída de casa. Tamanhos diversos, como as sombrinhas para moças, os guarda-chuvas coloniais, para aqueles que precisavam usar carroças se protegerem do sol ou então os duplos, feitos para duas pessoas com divisórias. Os materiais também variavam, alguns fabricados de seda pura, eram os preferidos pelas mulheres que escolhiam estampas e rendas, as peças podiam ser feitas também de algodão natural. Somente mais tarde chegaram tecidos impermeáveis e de maior resistência.
Quando Mário se casou com Célia, a filha do Tavares, ele passou a atender a clientela sofisticada, famílias importantes não só de Pelotas, mas de outras cidades e estados. O senhor simpático que conversa e se depara com o olhar distante, conta com saudade historias de um tempo bom. “Tinha uma goteira bem na entrada da primeira loja na rua XV de Novembro. As pessoas passavam e brincavam dizendo que era de propósito. O meu sogro sempre dizia que aquilo era para despertar os guarda-chuvas.”
O último profissional especializado no serviço manual de fabricação e conserto das peças já avisou que depois do dia 20 de setembro pretende parar com a atividade. Hoje ele atende a terceira geração de algumas famílias. Tem quem venha do Rio de Janeiro para consertar as sombrinhas. Em carnavais e outras atividades, ele produzia peças de época e “ao gosto do cliente”, mas a procura caiu bastante por causa da chegada de produtos da china.
A esposa de Mário está doente e ele pretende ir morar com os três filhos, treze netos e três bisnetos nos Estados Unidos. “Vou sentir saudade dos fregueses, da atividade. Aquilo que a gente faz com amor dá prazer. Cada obra que sai, fico olhando admirado e digo pra mim: Que categoria!”.
O número de sapateiros, alfaiates e outras profissões manuais está diminuindo. Nas ruas os antigos prédios voltam a ser revigorados, a restauração do Grande Hotel e do casarão seis já iniciou, mas os costumes e profissões dos tempos áureos da princesa do sul, estão se perdendo no tempo.